A dobra de deleuze-foucault
Catarina Pombo Nabais
[Este artigo retoma os capítulos dedicados à presença de Foucault no pensamento de Deleuze na minha tese de doutoramento Deleuze: Philosophie et Littérature, dirigida por Jacques Rancière e defendida em
Paris VIII em 2007. A tese será publicada em breve em Paris, pela editora l’Harmattan. Agradeço ao meu pai, Nuno Nabais, o convite para dar a conhecer esses capítulos, em versão portuguesa, neste volume de actas.] § 1. Deleuze leitor de Foucault
Tornou-se um cliché considerar as leituras que Deleuze faz de outros pensadores como puras projecções das suas próprias teses. E, de facto, é difícil ler, por exemplo, os seus livros sobre Hume, Nietzsche e Kant sem sublinhar aí as primeiras formulações da versão deleuziana do programa do empirismo transcendental. O modo como Deleuze destaca uma dimensão transcendental na teoria da imaginação de Hume, ou como faz aparecer a antropologia política da Genealogia da Moral de Nietzsche sobre um fundo de uma teoria kantiana da génese das faculdades, deixa bem perceber este método de leitura em espelho, onde cada conceito do complicado léxico filosófico do deleuzianismo se vai desenhando segundo um regime de parasitagem, de vampirização dos universos teóricos visitados. Em sentido inverso, há uma imensa rede de conceitos e de decisões teóricas de Deleuze cuja verdade não se deixa determinar sem retornar às imagens dos autores lidos. Sempre que se tenta explicar as teses mais singulares de
Deleuze, como aquelas sobre o plano de imanência, o virtual, as sínteses do tempo, a univocidade do ser, é-se imediatamente forçado a cair nestes abismos que são “o
Bergson” de Deleuze ou “o Espinosa” de Deleuze, ou melhor, nesta mise en abîme do método deleuziano de “contar um livro da filosofia passada como se fosse um livro imaginário e fingido”[1].
Impôs-se também a ideia de que os anos 70, os de colaboração com Félix
Guattari, teriam visto interromper os trabalhos