Construção de identidade
Educação e Afro-Brasileiros
Sérgio Luiz Fonseca Cruz
HISTÓRIA DE VIDA: CCONSTRUÇÃO DE IDENTIDADE
Dona Alzira, minha avó - uma linda senhora negra - sempre me dizia que “quem sabe a quentura da panela é a colher que mexe”. Creio que este dito popular foi criado por uma cozinheira negra que transitava da senzala para a cozinha da Casa Grande. Possivelmente os pais ou os avós da minha avó, nascida em 1921, vivenciaram a dor da escravidão no Brasil colonial. Apesar dos 117 anos de abolição da escravatura, eu e meus filhos continuamos sentindo “a quentura da panela”.
Sou negro, brasileiro e neto do Sr. Carlos – nascido em Cabo Verde, país do continente africano, colonizado por Portugal. Com esse histórico, desde a minha infância, eu tive que me defrontar, conviver, enfrentar e lutar contra as mais variadas formas de estereótipos, preconceitos e discriminações que estigmatizam homens, mulheres e crianças negras neste país. Como diz Caetano Veloso, “cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”.
Sou filho de Maria Estela Fonseca e Elcemiro Cruz. Meus pais sempre tiveram uma história amorosa muito conturbada. Minha mãe engravidou na época do namoro e meu avô ameaçou colocá-la para fora de casa. Ele disse à minha avó: “Eu fico com a criança: Estela vai embora”. Quando eu nasci meu avô reconsiderou sua postura e deixou minha mãe ficar. Nesta ocasião meus pais já estavam separados. Depois moraram juntos por alguns anos e aí houve a separação definitiva. Minha mãe me criou praticamente sozinha: trabalhava de manicure, saía cedo e chegava tarde.
Meus pais nunca se perceberam negros. Ao contrário, se valiam de “técnicas de embranquecimento” numa tentativa de negar a negritude. Por exemplo, Minha mãe até pouco tempo vivia ensinando técnicas para “afinar o nariz”, numa tentativa de negar a estética, o fenótipo negro, tomando por padrão introjetado o modelo branco como o melhor, o mais bonito. No pouco convívio com meu pai, por vezes eu o ouvi