auto da barca do inferno cena x

Estando o Juiz nesta conversa com o Diabo, chegou um
Procurador, carregado de livros, e diz o Juiz ao Procurador:
Juiz
Ó senhor Procurador!

Procurador
Beijo a sua mão, Juiz!
E esse Arrais, o que ele diz?

Diabo
Que será um bom remador.
Entre, bacharel doutor,
E vá logo tirando a água,
P’ra não afogar a mágoa!

Procurador
Ó barqueiro zombador,
Não vê? Sou Procurador!
Essa gente que aí está,
Para onde se destina?

Diabo
Para a infernal oficina!

Procurador
Dix! Não vou eu para lá!
Outro navio está cá,
Muito mais ajeitado!

Diabo
Ora, estou bem arranjado!
Chega desse blá-blá-blá!

Juiz (para o Procurador):
Você confessou, doutor?

Procurador
Não pensei que era fatal
O que me fazia mal!

Juiz
Eu muito bem confessei,
Porém, tudo o que eu roubei,
Escondi do confessor!

Procurador
E fez muito bem, senhor!

Diabo
Deixe de prosa e embarquemos,
Veja a caravela que temos?

Procurador
Ao navio do Anjo iremos!

Diabo
Ouçam aqui o seu Arrais:
Entrem, não ‘speremos mais!

Vão-se ambos à barca da Glória e, chegando, diz o
Juiz ao Anjo:

Juiz
Ó Arrais dos gloriosos,
Passe-nos neste batel!

Anjo
Oh, pragas para papel,
Para as almas odiosos!
Co’o vieram orgulhosos,
Sendo filhos da ciência?

Juiz
Oh, tenha de nós clemência!

Joane
Ei, homens dos breviários,
Rapinastis coelhorum
Et pernis perdiguitorum
Mijaram nos campanários!

Juiz
Não complique ainda mais
A nossa situação!

Joane
Cadê esses policiais35
Para levarem ladrão?
Pensavam que sou otário,
Vindo co’esse latinário?!

Anjo
A justiça Divinal
Manda virem carregados
Porque serão embarcados
Naquela barca infernal!

Juiz
Oh, livra-nos São Marçal
Da ribeira e deste rio!
Pensam lá que é desvario
Haver aqui tanto mal!

Juiz
Venha a negra prancha já,
Vamos ver esse segredo!

Procurador
Diz um texto do Degredo…

Diabo
Entre aqui, aqui se dirá…
E tanto que foram dentro da barca dos condenados, disse o Juiz à Brísida Vaz,