A importancia do voto
Luis Felipe Miguel
A adoção de cotas para mulheres candidatas é uma das experiências mais interessantes da democracia brasileira. Embora banalizada pela imprensa e objeto de um debate quase sempre superficial, ela coloca em jogo questões importantes, relacionadas com as limitações dos regimes democráticos concorrenciais de tipo ocidental. As cotas eleitorais implicam o questionamento de algumas das premissas básicas do ordenamento político liberal: o indivíduo como única unidade política legítima e o relativo isolamento da arena política (caracterizada pela igualdade formal entre os cidadãos) em relação às injustiças sociais. Ao mesmo tempo, põem em debate o sentido da representação, um termo vago, mas ao mesmo tempo crucial para a autoimagem dos sistemas políticos ocidentais (as “democracias representativas”). A medida tornou-se um ponto de controvérsia na agenda pública a partir do momento em que a futura Lei nº 9100/95 foi proposta, pela deputada Marta Suplicy, e sobretudo após a experiência das eleições de 1996 e 1998. No debate no Parlamento ou na imprensa, poucas vozes tiveram coragem de se levantar contra o objetivo que se pretendia alcançar, a maior eqüidade entre homens e mulheres na representação política — o que não significa
uma unanimidade efetiva quanto à questão, mas o reconhecimento de que a defesa aberta da exclusão das mulheres não integra mais o espaço do discurso legítimo. A polêmica se travou, então, sobre a ação afirmativa em si (isto é, sobre o meio) e sua adequação ao fim desejado. O resultado das eleições de 1998 aparentemente demonstrou o fracasso das cotas femininas, uma vez que diminuiu o número de mulheres eleitas para a Câmara Federal. A legislação brasileira de cotas é, para dizer o mínimo, tímida. Em primeiro lugar, não há reserva de cadeiras no Parlamento, mas apenas de vagas de candidatura. Ficam de fora todos os cargos preenchidos por eleição