Texto
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OS YANOMAMI NO CORAÇÃO
DAS TREVAS BRANCAS
Alcida Rita Ramos
Trabalho solicitado para publicação em Relaciones.
Estudios de historia y sociedad, revista publicada pelo
Colegio de Michoacán, México.
Brasília
2004
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OS YANOMAMI NO CORAÇÃO DAS TREVAS BRANCAS
Alcida Rita Ramos
Universidade de Brasília
Introdução
Depois das quantidades inusitadas de papel, de contas telefônicas e de saliva gastas com o escândalo gerado pela publicação de Darkness in El Dorado, ou melhor, pelo apavorado aviso eletrônico, no último dia de agosto de 2000, sobre sua iminente publicação (Lamphere 2003: 154), eu tinha decidido abandonar o caso de uma vez por todas. Havia participado do fórum promovido por Current Anthropology (Ramos 2001), do seminário organizado pela Associação Brasileira de Antropologia (in press a) e da sessão plenária que ocorreu durante a reunião da Associação Européia de Antropologia
(EASA) em Copenhague (Ramos 2002), dando por encerrado meu interesse no assunto.
Porém, como fantasmas de traumas mal resolvidos, algumas coisas insistem em nos assombrar. Volto novamente, espero que pela última vez, ao tema não pelo escândalo em si, mas porque no seu bojo persistem questões extremamente relevantes, ainda insuficientemente exploradas, sobre o fazer etnográfico e, principalmente, o lugar da ética na antropologia que nenhum antropólogo digno do nome pode ignorar.
Numa demonstração superlativa dos caminhos obscuros que a globalização pode trilhar, os índios Yanomami, que vivem na região montanhosa de difícil acesso que serve de fronteira internacional entre a Venezuela e o Brasil, tornaram-se o pivô involuntário de uma contenda de dimensões internacionais que por mais de um ano atormentou o mundo acadêmico dos Estados Unidos, numa mistura de competição entre egos, luta ideológica (ciência versus anti-ciência) e corrida por poder institucional. O destaque dado ao livro do jornalista estadunidense Patrick Tierney (2000)