Fichamento - Vigiar e Punir
13. Apresentamos exemplo de suplício e de utilização de tempo. Eles não sancionam os mesmos crimes, não punem o mesmo gênero de delinquentes. Mas definem bem, cada um deles, um certo estilo penal.
13.No entanto, um fato é certo: em algumas dezenas de anos, desapareceu o corpo supliciado, esquartejado, amputado, marcado simbolicamente no rosto ou no ombro, exposto vivo ou morto, dado com espetáculo. Desapareceu o corpo como alvo principal da repressão penal.
14.A punição vai-se tornando, pois, a parte mais velada do processo penal, provocando varias consequências: deixa o campo da percepção quase diária e entra no da consciência abstrata; sua eficácia é atribuída à sua fatalidade, não à sua intensidade visível; a certeza de ser punido é que deve desviar o homem do crime e não mais o abominável teatro; a mecânica exemplar da punição muda as engrenagens.
15.A execução da pena vai-se tornando um setor autônomo, em que um mecanismo administrativo desonera a justiça, que se livra desse secreto mal-estar por um enterramento burocrático da pena.
16.Mas, de modo geral, as praticas punitivas se tornaram pudicas. Não tocar mais no corpo, ou o mínimo possível, e para atingir nele algo que não é o corpo propriamente.
16.Utopia do pudor judiciário: tirar a vida evitando de deixar que o condenado sinta o mal, privar de todos os direitos sem fazer sofrer, impor apenas isentas de dor.
17.A redução dessas “mil mortes” à estrita execução capital define uma moral bem nova, própria do ato de punir.
18.A morte é então reduzida a um acontecimento visível, mas instantâneo. Entre a lei, ou aqueles que a executam, e o corpo do criminoso, o contato é reduzido à duração de um raio. Já não ocorrem as afrontas físicas; o carrasco só tem que se comportar como um relojeiro meticuloso.
18.Quase sem tocar o corpo, a guilhotina suprime a vida, tal como a prisão suprime a liberdade, ou uma multa tira os bens. Ela aplica a ei não tanto a um corpo real e