Demasiado humano, na verdade

Demasiado humano, na verdade Márcia Pereira SERRA1

Mesmo no aspecto biológico, a potencialidade do ser humano não parece ser algo totalmente mapeado, previsível. Isso pode ser percebido ao se assistir ao vídeo intitulado Deficiente visual anda de bike sozinho, usando a Eco-Localização, publicado no site da internet Youtube. Trata-se de um recorte de alguns minutos de um programa veiculado pelo canal de televisão pago norte-americano History Channel. Nele, é apresentado, na linguagem habitual do documentários, com imagens gravadas e narração em off, o talento realmente incomum de um homem norte-americano de Los Angeles chamado Juan Ruiz. Cego, ele desenvolveu um mecanismo de identificação e localização de obstáculos à sua frente, como carros ou paredes, e que lhe permite andar de bicicleta pela região onde vive, quase como se fosse guiado pela visão de que não dispõe.
O referido mecanismo é fundado na audição de Juan, que se desenvolveu de um modo não encontrado usualmente em pessoas cegas, nem tampouco em indivíduos dotados de visão normal. Para poder pedalar sem esbarrar no que esteja à sua frente, Juan realiza repetidamente um gesto bastante simples: ele emite estalidos com a língua. Isso basta para que consiga conduzir sua bike em segurança. Ao produzir pequenos ruídos, ele emite ondas sonoras que se irradiam e colidem com os objetos em geral situados ao redor e, principalmente, em frente a ele. As ondas sonoras, ao interceptarem algo, são refletidas e retornam aos ouvidos de Juan; caso o caminho esteja livre, essa reflexão não se verifica. Esse dispositivo é, de fato, aquele empregado há muitos milhares de anos pelos morcegos para se orientarem em seus voos noturnos, e mais recentemente incorporado pelos radares, construídos pela ação humana.
A habilidade é nomeada no vídeo como “ecolocalização”, ou, etimologicamente, localização espacial e ambiental.