Como é ser um morcego?
Thomas Nagel
Universidade de Nova Iorque
Tradução de Luís M. S. Augusto
A consciência é o que faz do problema da relação mente-corpo um problema verdadeiramente intratável. É por essa razão, talvez, que as discussões mais recentes acerca do problema da relação mente-corpo lhe dão tão pouca importância ou o deturpam de uma forma evidente. A recente vaga de furor reducionista produziu várias análises de fenómenos e de conceitos mentais forjadas com vista a explicar a possibilidade de uma qualquer variedade de materialismo, de identificação psicofísica ou de redução1. Mas os problemas por elas tratados são aqueles comuns a este e outros tipos de redução quando, na verdade, o que faz da mente-corpo um problema único, distinto do problema água — H2O ou do problema máquina de Turing — máquina IBM, do problema relâmpago — descarga eléctrica, do problema gene — ADN ou do problema carvalho — hidrocarboneto, é ignorado.
Todos os reducionistas têm a sua analogia favorita na ciência moderna. É extremamente improvável que qualquer um destes exemplos bem-sucedidos de redução sem qualquer relação uns com os outros possa vir a deitar alguma luz no problema da relação entre a mente e o cérebro. Mas, a verdade é que os filósofos compartilham com o resto da humanidade a tentação de explicar aquilo que é incompreensível em termos apropriados àquilo que é conhecido e bem compreendido, ainda que de natureza completamente diferente.
Este facto levou ao acolhimento de descrições implausíveis do mental, em grande medida porque elas permitiam tipos já conhecidos de reducionismo. Vou tentar explicar porque é que estes exemplos habituais não nos ajudam a compreender a relação entre a mente e o corpo — porque é que, de facto, não temos neste momento nenhuma noção do que poderá ser uma explicação da natureza física de um fenómeno mental. Sem a consciência, o problema da mente-corpo seria muito menos interessante; com a consciência, parece impossível de resolver.