40_questoes_do_dia_a_dia

4304 palavras 18 páginas
40 questões do dia-a-dia sobre o que é certo ou errado

Jerônimo Teixeira Quando o fantasma do rei aparece, no primeiro ato de Hamlet, o personagem Marcelo, um cidadão comum, observa: "Há algo de podre no reino da Dinamarca". O raciocínio embutido na frase, uma das mais famosas do teatro de William Shakespeare, é recorrente na história humana – e o Brasil pode estar vivendo um momento semelhante agora. O rei é um símbolo. Se ele virou alma penada, é sinal de que o país inteiro está doente. Mergulhado numa crise política que já se arrasta por onze meses, e ainda está longe de se esgotar, o Brasil começa a flertar perigosamente com aquilo que se poderia batizar de "síndrome de Marcelo": a tese de que governo e sociedade são igualmente corruptos e coincidem na desorientação moral. Se não bastassem todas as mentiras e escândalos em torno do mensalão, outras notícias reforçam a impressão de que os pilares da ética desmoronaram no âmbito institucional: um general interrompe a decolagem de um avião e tira dois passageiros do vôo para embarcar com sua mulher; o Exército negocia com traficantes para reaver armas roubadas; juízes defendem com unhas e dentes a prática do nepotismo e fazem greve para preservar vantagens econômicas desproporcionadas....
Será que essa lassidão moral nas camadas superiores da hierarquia política do país se espalha pelo tecido social? Será que os deslizes do cotidiano, por sua vez, impedem que se enxerguem em sua plenitude os desmandos dos governantes? São questões interessantes para cujo estudo o Brasil é hoje um laboratório quase perfeito. Não existem respostas fáceis. Os intelectuais tendem a acreditar na pureza natural do povo e na corrupção mandatória de qualquer governante ou membro da elite de um país. Será assim mesmo? "O problema está em nós. Nós como povo. Nós como matéria-prima de um país", escreveu recentemente o cronista João Ubaldo Ribeiro sobre o tema da corrupção. Ver defeitos no povo não é a regra. João Ubaldo é exceção.

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