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2055 palavras 9 páginas
A nau catrineta: velhas receitas, novos sabores

Ruth Silviano Brandão
Universidade Federal de Minas Gerais
A "Nau catrineta" de Rubem Fonseca flutua entre dois espaços, duas culturas, duas literaturas - a brasileira e a portuguesa - lendo a Historia do Brasil de forma macabra, irônica e fantástica, pelo riso, hesitação, e, ao mesmo tempo , estranheza que causa no leitor, com a emergência de um "Outro" recalcado pela cultura. Um Outro, estranho de nós mesmos e, no entanto, lugar de nosso reconhecimento, no momento mesmo do espanto que o conto nos causa. Causa de espanto, causa de escrita, escrita de um olhar que permite um viés talvez novo pelo impacto de leitura que provoca.
Como uma peça dramática, o texto de Rubem Fonseca inicia-se com uma estranha cena que se abre, no quarto de José, no dia de seu vigésimo primeiro aniversário. Único varão de uma família de bizarras figuras femininas que o cercam de todos os mimos e cuidados, é ele acordado por tia Olímpia, tia Regina e tia Julieta , que o esperam oferecendo-lhe, além do café da manhã, o segredo da família, guardado até esse dia e contido no Decálogo Secreto do tio Jacinto, onde se define a missão desse sobrinho único: José, objeto desse solene ritual_ parte da celebração de sua maioridade e consequente assunção à posição de chefe da família.
À sua entrada, tia Olímpia triunfalmente declama os versos iniciais do romance da Nau Catrineta:
Renego de ti demônio
Que me estavas a tentar
A minha alma é só de Deus
O corpo dou eu ao mar.
Tomou-o um anjo nos braços
Não nos deixou afogar,
Deu um estouro o demônio,
Acalmaram vento e mar
E à noite a Nau Catrineta
Estava em terra a varar.
(Fonseca,1943,103)
À noite haverá um jantar do qual participará uma moça especialmente escolhida por José e sujeita à aprovação das tias. Ermelinda Balsemão, Ermê, a noiva, chega assustada com o aspecto sombrio da casa e com a formalidade dos hábitos familiares.
Depois das apresentações, mantém-se uma animada

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