Érico verissimo - olhai os lírios do campo.do

95401 palavras 382 páginas
ERICO VERÍSSIMO

OLHAI OS LÍRIOS DO CAMPO

1ª Parte

O médico sai do quarto nº 122. A enfermeira vem ao seu encontro. - Irmã Isolda - diz ele em voz baixa - avise o Dr. Eugénio. É um caso perdido, questão de horas, talvez de minutos.
E ela sabe que vai morrer... Silêncio. Uma golfada de vento atravessa o corredor. Ouve-se o ruído seco de uma porta que bate. A irmã de caridade sente um calafrio, lembrando-se da madrugada em que morreu o paralítico do 103; a enfermeira de plantão contara-lhe horrorizada ter sentido o sopro gelado da morte entrar no quarto do doente. - Ele está em casa da família, doutor? - Não. Telefone para a chácara do sogro, em Santa Margarida.
Diga ao Dr. Eugénio que a Olívia quer vê-lo. Talvez ele ainda possa chegar a tempo... Encolhe os ombros, pessimista. Acende um cigarro e as mãos tremem-lhe um pouco. Irmã Isolda caminha para o fundo do corredor, entra na cabina do telefone, disca para o centro. - Alô! Alô! Fala o Hospital Metropolitano. É um caso urgente. Quero longa distância... As lágrimas escorrem-lhe pelo rosto.

« .. . veio a hemorragia. . . » - diz a voz velada e distante. Como se tivesse recebido a mensagem de desgraça primeiro que o cérebro, o coração de Eugénio desfalece, as suas batidas tornam-se espaçadas e cavas. «... o Dr. Teixeira Torres diz que é um caso perdido. Ela sabe que vai morrer... pediu para vê-lo. .. » Eugénio sente estas palavras com todo o corpo, sofre-as principalmente no peito, como um golpe surdo de clava. Uma súbita tontura embacia-lhe os olhos e o entendimento. Deixa cair a mão que segura o fone. Só tem consciência de duas coisas: de uma impressão de desgraça irremediável e da pressão desesperada do coração, que a cada batida parece crescer,inchar sufocadoramente. A respiração é aflitiva e desigual, a boca arde-lhe, o peito dói-lhe - é como se de repente lhe tombasse sobre o corpo toda a canseira de uma longa corrida

Relacionados