Passado e futuro das interpretações do país
André Botelho
Entre as décadas de 1920 e 1940 foram publicados alguns dos mais instigantes estudos sobre a formação da sociedade brasileira que permanecem nos interpelando de várias formas, a despeito da relação ambígua que as ciências sociais têm mantido com eles desde o início da sua institucionalização como carreira universitária e profissional na década de 1930. O legado intelectual desses estudos, constantemente atualizado pelas leituras críticas que recusam sua validade ou por meio de sua retomada para a formação de novas proposições sobre o país, também extrapolou as fronteiras acadêmicas, contribuindo para conformar, reflexivamente, modos de pensar e sentir o Brasil e de nele atuar ainda hoje presentes. Entre aqueles estudos, enfim, como muitos já observaram, incluem-se alguns dos livros que, ao fim e ao cabo, “inventaram o Brasil” (cf. Cardoso, 1993).
Publicado em 1920, Populações meridionais do Brasil, de Francisco José
Oliveira Vianna, abre a produção do período, seguido, na mesma década, por Retrato do Brasil, de Paulo Prado, que, como Macunaíma de Mário de Andrade, apareceu em 1928. Em 1933 foram publicados Casa-grande
& senzala de Gilberto Freyre e Evolução política do Brasil de Caio Prado
Jr.; três anos depois, Sobrados e mucambos, também de Freyre, e Raízes do
Brasil, de Sergio Buarque de Holanda. Na década seguinte, voltaram aos prelos Caio Prado e Oliveira Vianna, o primeiro com Formação do Brasil contemporâneo, em 1942, o segundo com Instituições políticas brasileiras,
Passado e futuro das interpretações do país, pp. 47-66
em 1949 – para citar apenas alguns dos mais emblemáticos ensaios do período. Comumente reunidos na expressão “ensaísmo de interpretação do Brasil”, esses ensaios não permitem, no entanto, uma definição estrita baseada em características cognitivas ou narrativas exclusivas, embora alguns traços lhes sejam constantes e possam distingui-los de outras