Memorial do convento

121644 palavras 487 páginas
José Saramago
Memorial do Convento

Para a forca hia um homem: e outro que o encontrou lhe dice: Que he isto senhor fulano, assim vay v. m.? E o enforcado respondeo: Yo no voy, estes me lleban.
P.e Manuel Velho

Je sais que je tombe dans l’inexplicable, quand j’affirme que la réalité — cette notion si flottante —, la connaissance la plus exacte possible des êtres est notre point de contact, et notre voie d’accès aux choses qui dépassent la réalité.
Marguerite Yourcenar

[1]
D. João, quinto do nome na tabela real, irá esta noite ao quarto de sua mulher, D. Maria Ana Josefa, que chegou há mais de dois anos da Áustria para dar infantes à coroa portuguesa e até hoje ainda não emprenhou. Já se murmura na corte, dentro e fora do palácio, que a rainha, provavelmente, tem a madre seca, insinuação muito resguardada de orelhas e bocas delatoras e que só entre íntimos se confia. que caiba a culpa ao rei, nem pensar, primeiro porque a esterilidade não é mal dos homens, das mulheres sim, por isso são repudiadas tantas vezes, e segundo, material prova, se necessária ela fosse, porque abundam no reino bastardos da real semente e ainda agora a procissão vai na praça. Além disso, quem se extenua a implorar ao céu um filho não é o rei, mas a rainha, e também por duas razões. A primeira razão é que um rei, e ainda mais se de Portugal for, não pede o que unicamente está em seu poder dar, a segunda razão porque sendo a mulher, naturalmente, vaso de receber, há-de ser naturalmente suplicante, tanto em novenas organizadas como em orações ocasionais. Mas nem a persistência do rei, que, salvo dificultação canónica ou impedimento fisiológico, duas vezes por semana cumpre vigorosamente o seu dever real e conjugal, nem a paciência e humildade da rainha que, a mais das preces, se sacrifica a uma imobilidade total. Depois de retirar-se de si e da cama o esposo, para que se não perturbem em seu gerativo acomodamento os líquidos comuns, escassos os seus por falta de

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