Leonardo da Vinci - tratado de Pintura
LEONARDO DA VINCI
(1452-1519)
TRATADO DA PINTURA
(1490-1517)
Como Alberti, cujo tratado seguramente conhecia,1 Leonardo da Vinci afirma o principio de universalidade da pintura contra toda especialização dos artistas.
Essa afirmação dá ensejo a uma diatribe contra os retratistas, motivada, ao que parece, por reagirem contra as proposições de Alberti relativas aos “talentos particulares”.2 Leonardo reprova aos pintores de retratos, de um lado, não mostrarem seus temas em ação, quando a pintura do movimento é a condição e um dos meios da representação da istoria; mas também, acusação mais séria, dedicarem-se tão exclusivamente à restituição de um personagem, que negligenciam com isso todos os outros elementos que constituem a história. Esse reproche pode se aplicar não apenas aos retratistas mas também aos artistas que pintam naturezas-mortas ou paisagens
—
em verdade a todos os que
continuam sendo sobretudo pintores especializados, mesmo quando empreendem uma pintura de história. Leonardo inaugura aqui um debate que se prolongará até o século XVIII, ou mesmo o XIX, e culmina com Diderot:3 o que envolve a questão de saber se o grande gênero pode e deve, a exemplo dos gêneros menores, desenvolver a representação do real até a reprodução dos mínimos detalhes, ou se a insistência nesses detalhes secundários traz o risco de se afastar do essencial e diminuir o efeito do quadro.
As notas de Leonardo, em contrapartida, contêm elementos de um longo capítulo sobre a paisagem, com uma vigorosa defesa desse gênero. Esse capítulo, jamais organizado — como tampouco o restante das notas que constituem o projeto de tratado
—,
poderia ter começado com a famosa meditação (que Leonardo desenvolve a partir de uma prática
que atribui a Botticelli) sobre a mancha,