A carteira

A Carteira
Machado de Assis

Novo final
Laís Cerqueira

Mas daí a pouco tirou-a outra vez, e abriu-a, com vontade de contar o dinheiro. Eram setecentos e trinta mil-réis. Tratava-se de um milagre, todas as dívidas pagas por um quase tropeção. Não usar de algo dado pelos céus pareceu-lhe um pecado, mas, por outro lado, haveria de ter dono, e um preocupado.
Tratou de procurar por algum indicativo de posse. Deparou-se com documentos, cartões de visita, cartas, e, tomado pela curiosidade, abriu os envelopes. Primeiramente um pedido de desculpas por má comportamento endereçado a um senador. Tinha o segundo envelope rompido em mãos, desistindo de ler o conteúdo, até ver a quem era endereçada.
Uma carta de amor, um encontro às escondidas sendo marcado, e encabeçando o papel, “Amada Amélia”.
Honório observou os documentos desejando queimar a eles, assim como ao dono, entretanto tratou de coloca-los de volta na carteira, assim como a carta mal dobrada e todo o dinheiro.
Chegando em casa, achou Gustavo, sua feição franzida como quem muito pensa com algo preocupado, tal como D. Amélia, ambos lado a lado, no sofá de sua própria casa. Pediu à esposa que deixasse-os a sós, precisava tratar-lhe de um assunto urgente.
— Mete a mão no bolso; não te falta nada?
— Falta-me a carteira, disse o Gustavo sem meter a mão no bolso. Sabes se alguém a achou?
— Achei-a eu, disse Honório entregando-lha.
Pensou ele, e em um impulso retomou o objeto em mãos, tendo na face do amigo surgido a confusão. O homem abriu a carteira tomando, entre os dedos, o dinheiro. Entregou então definitivamente o que era devido ao amigo.
— Acho que isso me pertence, disse Honório a colocar as notas no bolso do paletó e sorrindo amargamente explicou-lhe o porquê. É por minha esposa, ela parece custar mais, mas contentar-me-ei com os setecentos e trinta.
Honório saiu, indo preparar-se para o jantar, enquanto, na sala, Gustavo sentava-se com o envelope violado em mãos, e a boca em descrença,