ISM LIA

ISMÁLIA, de Alphonsus de Guimaraens

Quando Ismália enlouqueceu,
Pôs-se na torre a sonhar...
Viu uma lua no céu,
Viu outra lua no mar.

No sonho em que se perdeu,
Banhou-se toda em luar...
Queria subir ao céu,
Queria descer ao mar...

E, no desvario seu,
Na torre pôs-se a cantar...
Estava perto do céu,
Estava longe do mar...

E como um anjo pendeu
As asas para voar...
Queria a lua do céu,
Queria a lua do mar...

As asas que Deus lhe deu
Ruflaram de par em par...
Sua alma subiu ao céu,
Seu corpo desceu ao mar...

Interpretação de texto

1ª estrofe

Quando Ismália enlouqueceu, Isolada em sua torre, Ismália, contempla a lua no céu
Pôs-se na torre a sonhar... e o seu reflexo no mar., num momento de devaneio.
Viu uma lua no céu,
Viu outra lua no mar.
Neste poema simbolista, narra-se, com delicadeza e plasticidade notáveis, o desvario de Ismália que, à janela da torre, viu a lua a espelhar-se no mar ("Viu uma lua no céu, / Viu outra lua no mar"). Não se pode subestimar a importância da antítese marcada com veemência: a lua verdadeira, no céu; a lua ilusória, no mar. Tal visão antitética será disseminada pelo texto, pois a “prisioneira” se dividirá entre dois espaços conflitantes, quais sejam o da realidade e o do sonho. A imagem profundamente poética da moça fechada em sua torre resgata as frágeis figuras de antigas histórias, como aquela em que a personagem encarcerada jogava as suas tranças. Assim, Ismália lembra uma personagem romântica, marcada pela sensibilidade de seu comportamento, pela fatalidade de sua condição e pelo conflito de sua vivência – que podem ser explicados pela loucura que a acomete.
À antiquíssima figura feminina reúne-se o medievalismo da forma: o poema é estruturado em redondilhas maiores (versos heptassílabos), que é a forma herdada da Idade Média, e paralelismo, que acentua a sonoridade musical do texto. O mesmo esquema rímico repete-se em todas as estrofes, com os mesmos sons e a mesma distribuição (rimas