Auto Da Barca Do Inferno
Gil Vicente
A obra de Gil Vicente representa o ponto mais alto da dramaturgia em língua portuguesa. A simplicidade dramática e o poder ferino de suas críticas sociais explicam sua popularidade em todos os meios e todas as classes sociais. Gil Vicente não perdoou nenhum grupo social ou profissional em suas mordazes observações da decadência moral que tomava conta de Portugal no período expansionista.
O Auto da barca do inferno apresenta um só ato, como era comum nos autos medievais. Sua estrutura é simples, pois a intenção do autor não é fixar conflitos psicológicos, mas criar um teatro de sátira social, um teatro de ideias, um teatro polêmico.
A comicidade se evidencia à medida que nos deparamos com a criação de tipos comuns, arquétipos de uma sociedade iniciando-se no mercantilismo quinhentista, mas com um dos pés ainda preso à cultura medieval e à falsidade religiosa do espírito das cruzadas.
O Auto da barca do inferno é um exemplo do poder crítico e dos valores morais e religiosos defendidos por Gil Vicente em sua dramaturgia. Nele encontramos tanto o moralismo medieval, herança da Igreja Católica e da Santa Inquisição, quanto a representação dos grupos sociais portugueses da época: corregedores, juízes, alcoviteiras.
Nesse auto, os mortos chegam para embarcar rumo ao inferno ou ao paraíso. É a hora da decisão. É claro que todos acham que merecem o paraíso. Surgem então as discussões com o diabo e o anjo.
Os mortos são figuras alegóricas, representando os tipos sociais:
Fidalgo – representa simbolicamente a aristocracia lusitana. Fartou-se dos prazeres materiais e exige, por causa de sua classe social, o direito de embarcar para o céu. Resignase a ir para o Inferno quando percebe que suas tentativas, primeiro de embarcar com o Anjo e depois de voltar à vida, foram frustradas.
Onzeneiro – representa os agiotas, que exploravam a população necessitada de Portugal à época do mercantilismo. Insiste em embarcar para o Céu com seu bolsão. Não