O dia que o amor morreu

702 palavras 3 páginas
Na manhã que o amor acabou tinha urina no chão da sala. Uma pocinha bem pequena perto da planta. Fiquei na dúvida se era água caída do pratinho do vaso ou malcriação de bicho. Talvez eu tivesse regado e dado um quarto de antibiótico pra cachorra que estava com tosse. Na dúvida, pensei em fazer de novo. Sem saber, como expliquei, se era repetido. Água em dobro e metade do remédio seriam demais. Mas não fazer, caso fosse a primeira vez, seria de menos. Eu seco, eu rego, eu medico. Os imperativos simples e práticos de verbos serviçais burlavam dores pessoais de pronomes.

Na manhã que o amor acabou, almocei na minha mãe. Ela contou que a colcha colorida não tinha saído bonita na foto do site da imobiliária. Eu chorei e ela quis saber se colcha colorida me lembrava alguma coisa. Não lembrava. Mas as frases com alguma graça e nascidas pra nada emprestavam o charme da sua promessa, sempre me sabendo em urgências dosadas. Eu retornava com a felicidade direta de quem é procurada antes de se proteger e apertava suas letras comprovando, com minha digital, uma existência catalogada. Meu pensamento era um carimbo no horizonte toda vez que você gostava de ouvir.

Foram duas lágrimas. A primeira despencou rapidamente, como um suicida magrinho e sem talento. A segunda ficou um tempo ninada pelas bordas até que caiu já quase seca nem passando da metade do rosto. O sofrimento foi tão ralo que sequer alcançou o nariz. Fiquei com preguiça de alguma saudade surpresa crescer escondida e me apunhalar em brechas de fraqueza e carinho, mas ela nunca apareceu e agora, se chegasse, seria só uma fantasia bordada de última hora pelo tédio. Na manhã que o amor acabou, eu cismei que probióticos me protegem de não pegar gripe e que pego gripe sempre que o amor acaba. Me enchi de iogurte e isso me mostrou uma novidade em ver um amor acabando: era momento de adorar cabisbaixa uma história mas eu estava mais ocupada em me lançar cuidadosa aos dias que nem existiam.

Que nome tem estar cagando

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