A minha vida é um barco abandonado
A minha vida é um barco abandonado
Infiel, no ermo porto, ao seu destino.
Por que não ergue ferro e segue o atino
De navegar, casado com o seu fado?
Ah! Falta quem o lance ao mar, e alado
Torne seu vulto em velas; peregrino
Frescor de afastamento, no divino
Amplexo da manhã, puro e salgado.
Morto corpo da acção sem vontade
Que o viva, vulto estéril de viver,
Boiando à tona inútil da saudade.
Os limos esverdeiam tua quilha,
O vento embala-te sem te mover,
E é para além do mar ansiada Ilha.
Análise
“O Eu – lírico fala da sua vida, fazendo uma comparação com um barco abandonado num porto. Sente que ela está estagnada e não cumpriu seu destino, e não cumpriu porque lhe faltou vontade de o fazer, e agora sua vida está como um barco morto no porto sem chegar à ilha da felicidade.”
Miguel Torga
Brinquedo
Foi um sonho que eu tive
Era uma grande estrela de papel
Um cordel
E um menino de bibe
O menino tinha lançado a estrela
Com ar de quem semeia uma ilusão
E a estrela ia subindo, azul e amarela,
Presa pelo cordel à sua mão
Mas tão alto subiu
Que deixou de ser estrela de papel
E o menino ao vê-la assim, sorriu
E cortou-lhe o cordel.
Análise
O tema central do poema é o sonho, que na realidade aparece sob a forma de esperança
Na primeira parte do texto inicia se um sonho onde se insere uma estrela de papel, um cordel e um menino de bibe. A estrela representa a esperança de um dia brilharmos: “O menino tinha lançado a estrela / Com ar de quem semeia uma ilusão”; o cordel demonstra que num determinado momento podemos estar presos a algo e, no seguinte, já não estar “(...) E o menino ao vê-la assim ,sorriu/ E cortou-lhe o cordel; o menino representa a alegria e a esperança “(...) Foi um sonho que eu tive / Era uma grande estrela de papel / Um cordel/ E um menino de bibe”.
Na segunda parte do texto deparamo-nos com o desejo do menino de lançar a estrela, ou como nos diz o poema, como de quem semeia