Uma Flor de dama

Uma Flor de Dama
(adaptação do texto "Dama da Noite" de Caio F. Abreu)

Não, não é nada não. Até parece que eu, até parece que eu não sei que esse tipo de coisa acontece. Não, ninguém precisa me dizer não, eu sei, eu sinto, eu vejo, daí eu faço de conta que não acontece. É que tem certas coisas na vida, boy, que a gente não escolhe não, sabia? Eu, por exemplo, nordestina, pobre, do interior e viado... Aí tá lascada, né? Se fosse pelo menos mulher, se bem que você tem razão, eu podia mudar não é? Botar peito, bunda, tomar buclina, fazer a tal da operaçãozinha, aí eu podia ser quem eu quisesse ser, quem eu quero ser de verdade. Será? E a essência, aquilo que você é de verdade, será que muda? Você sabe que eu tenho pra mim que essas coisas é igual escultura? Você amassa, amassa, amassa, alisa, alisa, alisa mas não deixa de ser barro! Não, não tô falando mal de quem faz isso não, quem sou eu pra falar mal. Mas tem gente que fala, sabia? Fala! Chama a gente de macaca, espantalho, palhaça, mas eu vou te dizer uma coisa, viu: a gente só é espalhafatosa quando quer. Se eu quiser, saio daqui agora com você, passo a noite fudendo, e ninguém daqui vai ver ou saber com quem foi que eu saí, não. Ah, você acha? Eu tenho é certeza, meu querido. Como se eu não estivesse por fora do movimento da vida. A vida, a vida, vai rodando, rodando, rodando, feito roda-gigante, com todo mundo dentro, menos eu, eu sempre fico de fora, como se tivesse desaprendido a linguagem dos outros, sabe, a linguagem que eles usam quando rodam assim e assim por diante nessa roda-gigante. Você tem que ter uma senha, um passe, um código, sei lá. Você diz qualquer coisa do tipo bá, aí o cara deixa você entrar, sentar e rodar na roda, com todo mundo. Menos eu, eu sempre fico de fora. Parada, pateta, ridícula, com a cara cheia, louca de vontade de estar lá, rodando junto com eles nessa roda idiota. Você tá me entendendo, garotão? Nada, você não tá entendendo porra nenhuma. Dama da noite. Todo mundo me