Trabalho

I

Lila Earnshaw disse uma vez que a vida é como um mar de escolhas; somos apenas peixes indecisos sobre qual corrente tomar. Era uma merda de metáfora, no entanto, absurdamente humana. Vovó está realmente delirando, Lucy havia dito, quando ela e sua mãe deixaram o quarto da senhora no hospital. E ela estava morrendo, também; um câncer no fígado. “Em uma expectativa de vida comum, tomamos em média dez grandes decisões, das quais ao menos cinco nos levarão a caminhos indesejáveis. Pequenos empecilhos, grandes problemas... Ambos nos guiam a um terrível arrependimento”, a avó dissera, antes que os médicos lhe aplicassem um sonífero na veia. Delirando, é claro, pensou Lucy. Duas horas depois Lila se foi, e agora que três anos se passaram, Lucy não entendeu porque essa lembrança voltara. Ainda parecia estranhamente absurdo, mas é claro, era absurdo. Do que Lucy poderia se queixar? Ela tinha uma vida perfeita. Vivera todos os seus dezessete anos sem grandes empecilhos, então o que poderia tornar a vida tão difícil, afinal? Más escolhas? Definitivamente não, concordou Lucy. Era tudo incrível, de modo que ela nunca parecera triste ou abalada. Nem mesmo a morte de sua avó ou o seu pai alcoolatra(e agora falecido) deixou-lhe pra baixo. Todos pareciam amar ela, e a vida estava mais para um mar de rosas do que de escolhas. Ela quase sentia como se tudo que ela escolhesse fosse dar certo, independente das circustâncias. Nem mesmo sua imensa popularidade geravam-lhe críticas. Então, porquê a vida dos outros era tão difícil? Que más escolhas seriam essas, que podiam ferrar com tudo? Não lhe parecia aceitável. “Tomamos em média dez grandes decisões, das quais ao menos cinco nos levarão a caminhos indesejáveis”, a voz da avó ecoou em sua cabeça, a lembrança exatamente igual como acontecera. Talvez seja esse pequeno fator que fadara Lucy Earnshaw à sua má sorte; talvez ela já houvesse feito cinco boas escolhas, e só lhe restariam cinco grandes fracassos. Quando Lucy