Sete observações sobre a possibilidade de um trágico moderno - que poderia ser um trágico (do) quotidiano

5949 palavras 24 páginas
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Sete observações sobre a possibilidade de um trágico moderno – que poderia ser um trágico (do) quotidiano1
Jean-Pierre SARRAZAC2
Universidade de Paris III – Sorbonne Nouvelle
Para meus alunos e a todos do “Grupo de Pesquisa sobre a Poética do Drama Moderno e Contemporâneo”

1. Um trágico separado da tragédia
Se há um trágico moderno, é um trágico desligado da tragédia. O Século das Luzes a um só tempo estabelece a constatação do esgotamento do modelo dramatúrgico da era clássica e marca a morte da tragédia. Ao programar a supressão do “golpe de teatro” e sua substituição pelo “quadro” (que haja em uma peça “tantos quadros quanto momentos favoráveis ao pintor”), Diderot põe fim, ao menos na teoria, ao modelo neoaristotélico. Os dramaturgos franceses do século XVII jamais souberam com precisão, Pierre Corneille no topo da lista, o que era a katharsis trágica. Mas o que é certo é que, sem golpe de teatro
(peripeteia) – associado ou não a um reconhecimento (anagnorisis) – não poderia haver, para
Aristóteles, catarse e, assim, tampouco tragédia.
No drama projetado por Diderot, a fábula (mythos) não é mais, como em Aristóteles, a “alma” da peça – pelo menos não como “sistema de fatos” fundamentado na concatenação das ações e na progressão dramática. O curso da ação se interrompe, a história se fragmenta segundo o princípio de uma sucessão de quadros. O quadro suspende o tempo da ação, a corrida em direção à catástrofe: em um único “instante prenhe”, ele concentra o passado, o presente e o futuro. Colocado diante do quadro, o espectador sem dúvida sente emoção, mas uma emoção a tal ponto permeada de reflexão que não poderia causar essa descarga afetiva coletiva, provocada pelo terror ou pela piedade, que pressupõe a catarse trágica. É imperativo insistir: o desaparecimento da tragédia não está em nada ligado a uma desaparição do trágico. É de ordem dramatúrgica e social. Com toda a razão,
George Steiner opõe o teatro “sério”, que começa com

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