Sereno

Sereno
Quando criança, mamãe dizia que havia um monstro de olhos rútilos e grandes, com dentes enormes, garras afiadíssimas, que, dentre tantas coisas que mamãe dizia que o monstro fazia com crianças desrespeitosas, estava à voracidade com que devorava crianças com farinha e catchup (pensando bem hoje em dia, vejo que essa mistura não seria nada boa para o monstro).
O monstro chamava-se “Sereno”.
Singelo que era, caia feito um patinho em suas tramas ardilosas, me fazendo comer “mato” e tudo o que, para mim, tinha gosto ruim naquela época,dormia cedo, aprontava menos do que de costume; era um verdadeiro querubim perante meus amiguinhos de escola e pregava a angelitude dentre eles como bom amigo que sou não queria que meus amigos fossem devorados pelo Sereno, contei-os sobre o monstro; não levaram a sério minha história, mas avisei que, se por um acaso, fossem pegos, não seria minha culpa. Tudo isso para não ser devorado por aquele monstro que me dava até arrepios só de pensar em seus olhos cintilantes me olhando severamente e com olhar de repreensão, lambendo os beiços enormes (imaginava-os como os da
Angelina Jolie, ou algo verossímil).
Depois de crescido, descobri que o sereno não passava de um sinônimo, segundo o dicionário meu fiel escudeiro-, para coisas sossegadas, calmas, amenas;já no popular tem a resignação de ar livre, rua, chuva fina. E esse último significado me deu outro murro no estômago, estava despreparado para ele emocionalmente e fisicamente (tinha uma saúde das mais frágeis), foi como um nocaute ala Anderson Silva, ficava com medo de sair à rua, pois minha mãe gritava de dentro de casa: - Menino, saia já desse sereno se não vai pegar alguma doença! E, de repente, retrocedia aquela imagem do monstro novamente em minha cabeça, apesar de já saber que não passava de uma lenda inventada pela minha mãe, mas mesmo assim eu pensava: “Além de comer criancinhas esse monstro também nos faz adoecer?”. Eu entrava e ficava horas a fio