Quando é...

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Rubem Alves: Quando o belo também é despedida
No pôr-do-sol, este momento se escande: é quando o efêmero ganha uma expressão de beleza. Por isso, não há por que fugir da tristeza. Há momentos em que ela é uma amiga verdadeiramente fiel
Rubem Alves

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Renata Ursaia

Hoje quero falar da tristeza. Não me pergun¬tem por que, pois eu mesmo não sei. A tristeza não pede licença, não se explica. Vai chegando de mansinho e espalhando seu perfume de jasmim pelas coisas, até que todas ficam encantadas pela beleza que nela mora. Ficam belas-tristes as nu¬vens do céu, tristes-belos os bem-te-vis nos galhos das árvores, belos-tristes os objetos silenciosos do meu es¬cri-tório, e até mesmo o café-da-ma¬¬nhã fica triste-belo... A tristeza é sem-pre bela, pois ela nada mais é que o sentimento que se tem ante uma beleza que se perdeu...
Não sei o que a chamou. Teria sido a visão das florestas ardendo, com seus prenúncios de deser¬tos quentes e fins do mundo, os pássaros fugindo para nunca mais voltar? Ou a visita a lugares antigos amados... Ah! Quem ama nunca deveria voltar... Lembro-me dos versos que decorei, o poeta visitando paisagens de outros tem¬pos e cadenciando a sua tristeza com um refrão que se repete. “São estes os sítios? São estes... Mas eu o mesmo não sou. Marília, tu chamas? Espera que eu vou.“ Até a bem-amada fica à espera quando o corpo tenta recuperar os espaços perdidos. Pois é. Visitei lugares de minha infância lá em Minas, e vi que a casa velha onde morei já não existe e nem a jabuticabeira que reguei e as três paineiras a cuja sombra me assentei. Fiquei ali, diante dessas ausências. E percebo que tristeza é isto: estar diante de um espaço onde um dia houve o encontro. Saber que, cedo ou tarde, tudo o que está presente ficará ausente. A tristeza testemunha que o mistério da despedida está gravado em nossa própria carne. “Quem nos desviou assim”, perguntava Ril¬ke, “para que tivéssemos um ar de despedida em tudo o que fazemos?” Não é

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