poemas

Baile à fantasia

Meus olhos amanheceram nublados e tinham a expressão mais carregada que as nuvens daquele dia. Meu sangue estava frio e circulava em minha mente fria, calculista e lógica . Minhas ações obedeciam criteriosamente o mapa que em minha alma havia se desenhado. Até mesmo minha ida ao banheiro parecia ser uma ação isolada de um miraculoso plano. Minha casa naquele momento transformara-se em um campo de concentração: eu, o executor aguardando ansioso pela vítima.
Passei o dia todo contemplando aquela caixinha dourada de apenas dez centímetros quadrados. Fixei meus olhos em seu conteúdo, um líquido translúcido, por onde como uma luz atravessei sua matéria densa e turva, invadindo e empreendendo viagem ao passado. Viagem que me fez reativar na memória, pontos específicos de uma vida desmoronada. Fui despertado desse transe pelo toque da campainha. Era o entregador da loja de fantasias que trazia meu pierrô, personificação perfeita do que tenho sido: um palhaço infeliz.
Enfim é chegado o momento, o baile à fantasia acontecia em uma das coberturas mais caras da Riviera. Tudo ali representava o poder do dinheiro e correspondia ao perfil da anfitriã que naquela noite era Cleópatra, mulher de estirpe refinada cuja preocupação era o unicamente o destaque social. Seu sucesso, fruto de sua inconseqüente ambição e de minha decadência, em breve receberia sua paga. O ambiente era de um colorido fútil, recheado de pessoas fúteis, dissimuladas em seus personagens. Deparava-me com piratas, vampiros e cinderelas..... Mas queria apenas Cleópatra.
Bebidas, eram me servidas as mais variadas, mas aceitei apenas de uma taça, uma única taça de champangne, a qual numa combinação devastadora misturei o conteúdo da caixinha dourada. Não demorou muito para que o desfecho da história se mudasse, a antiga serpente transformara-se agora em um pierrô portador do elixir da vingança.