literatura
A Cristo S. N. Crucificado, estando o poeta na última hora de sua vida.
Pequei, Senhor, mas não porque hei pecado,
Da vossa alta clemência me despido;
Porque, quanto mais tenho delinqüido,
Vós tenho a perdoar mais empenhado.
Se basta a vos irar tanto pecado,
A abrandar-vos sobeja um só gemido:
Que a mesma culpa, que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado.
Se uma ovelha perdida e já cobrada
Glória tal e prazer tão repentino
Vos deu, como afirmais na Sacra História,
Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada,
Cobrai-a; e não queirais, Pastor Divino,
Perder na vossa ovelha a vossa glória.
Vocabulário
Clemência: perdão, indulgência.
Desgarrada: perdida, pecadora.
Despido: despeço.
Delinguido: pecado.
Sobeja: é necessário.
Cobrada: recuperada.
Sacra História: as Sagradas Escrituras.
"O que vos parece? Suponhamos que um homem possua cem ovelhas e uma se extraviou. Não deixará ele as noventa e nove na montanha para ir buscar a ovelha que se extraviou?"
Mt 18:12
O exemplo mais conhecido de sua literatura sacra é o soneto A Jesus Cristo Nosso Senhor. Numa curiosa dialética, o poeta apela para a infinita capacidade de Cristo em redimir os piores pecadores, alegando que a ausência de perdão representaria o fim da glória divina. Trata-se, pois, de um poema simultaneamente contrito e desafiador, humilde e presunçoso.
Baseia-se numa passagem do Evangelho de S. Lucas, precisamente no capítulo 15, versículo 2 a 7, onde Jesus Cristo conta-nos a parábola (uma narrativa curta que transmite um conteúdo moral) da ovelha perdida e conclui dizendo que ´´há grande alegria nos céus quando um pecador se arrepende de seus pecados.``
A estrutura formal desse soneto de Gregório de Matos apresenta o esquema de rimas interpoladas nos quartetos (ABBA ABBA) e emparelhada nos tercetos , com versos decassílabos (predominantemente heróicos).