Laura bohanann

4828 palavras 20 páginas
Shakespeare no meio do mato
Laura Bohannan
[BOHANNAN, L. “Shakespeare in the bush”. In:
Natural History, ago./set. 1966]
Um pouco antes de partir de Oxford rumo à tribo dos Tiv, na África Ocidental, participei de uma conversa sobre a temporada em Stratford.
— Vocês americanos — disse um amigo — freqüentemente têm dificuldades com Shakespeare. Afinal de contas, ele era um poeta tipicamente inglês, e é fácil interpretar o universal de forma equivocada por uma falta de entendimento do que é particular. Protestei que a natureza humana é praticamente a mesma em todo o mundo; pelo menos o enredo geral e a motivação das grandes tragédias seriam sempre evidentes — em qualquer lugar — embora alguns detalhes de costumes talvez precisassem ser explicados e dificuldades de tradução pudessem produzir outras pequenas mudanças. Para pôr fim a uma discussão que não conseguíamos concluir, meu amigo me deu um exemplar de Hamlet para que eu o estudasse quando estivesse na África, no meio do mato; ele esperava que a leitura elevasse minha mente, distanciando-a de seu ambiente primitivo, e que eu, por meio de prolongada meditação, atingisse a graça da interpretação correta.
Era minha segunda viagem de campo para aquela tribo africana, e eu me considerava pronta para morar em uma de suas partes mais remotas — uma área difícil de atravessar, mesmo a pé. Finalmente me acomodei na colina de um velho muito sábio, chefe de uma aldeia de cerca de 140 moradores, todos seus parentes próximos ou filhos e esposas desses parentes.
Como os outros anciãos da redondeza, o velho passava a maior parte de seu tempo realizando cerimônias que na época eram raramente vistas nas regiões mais acessíveis da tribo. Eu estava deliciada. Logo haveria três meses de isolamento forçado e tempo livre, entre a colheita, que acontecia logo antes da cheia dos pântanos, e a formação de novas roças, quando a água baixava. Nesse período, pensava eu, eles teriam ainda mais tempo para realizar

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