Depois de partir

Acorrentado entre os braços de pele macia e ferrugem de cheiro adocicado, me esforço para me desvencilhar da força de um abraço que me aperta e me acolhe com seu afeto inconfundível. Seu toque cuidadoso me enche de novos ares de felicidade, e os traços do seu sorriso talhado cuidadosamente, alinhando perfeitamente dentes e lábios, formam um riso pouco comum nesse mundo tão duro, materialista e irreal. Entre gargalhadas e mais gargalhadas, as lágrimas de alegria que escorrem dos olhos claros são um exagero admirável. A sua presença me traz suaves sensações de bem estar, como o acordar de um breve cochilo, com os olhos ainda marejados de sono e entre o som das trovoadas e das gotas da chuva que caem incessantemente, sentir o conforto e o aconchego do nosso encaixe. Das nossas pernas que se entrelaçam naturalmente, do nosso riso efusivo, da nossa falta de fôlego. Entre muitos caminhos obscuros, experimentei o gosto de outros maus-amores, da ausência do senso de humor e do afago de mãos ásperas maquiadas pela beleza de uma mulher fútil e perfeita vista a olho nu.
Meu estado de embriaguez me permite ser piegas para falar assim de você. A visão embaçada e o corpo dormente dificultam o meu equilíbrio nessa calçada esburacada, que mais parece uma corda bamba. Foi esse o único meio que encontrei de olhar para você novamente, de sentir seu toque, seu calor. Eu gosto de te ouvir cantar, mesmo que seja assim, completamente desafinada. Eu gosto de ver o seu sorriso, mesmo que seja meio encabulado. Eu gosto de olhar para você. Eu gosto de você e você teve que partir.