casa de penção,de Aluisio de AZEVEDO

13450 palavras 54 páginas
CASA DE PENSÃO

I

Seriam onze horas da manhã.

O Campos, segundo o costume, acabava de descer do almoço e, a pena atrás da orelha, o lenço por dentro do colarinho, dispunha-se a prosseguir no trabalho interrompido pouco antes. Entrou no seu escritório e foi sentar-se à secretária.

Defronte dele, com uma gravidade oficial, empilhavam-se grandes livros de escrituração mercantil. Ao lado, uma prensa de copiar, um copo de água, sujo de pó, e um pincel chato; mais adiante, sobre um mocho de madeira preta, muito alto, via-se o Diário deitado de costas e aberto de par em par.

Tratava-se de fazer a correspondência para o Norte. Mal, porém, dava começo a uma nova carta, lançando cuidadosamente no papel a sua bonita letra, desenhada e grande, quando foi interrompido por um rapaz, que da porta do escritório lhe perguntou se podia falar com o Sr. Luís Batista de Campos.

— Tenha bondade de entrar, disse este.

O rapaz aproximou-se das grandes de cedro polido que o separavam do comerciante.

Era de vinte anos, tipo do Norte, franzino, amorenado, pescoço estreito, cabelos crespos e olhos vivos e penetrantes se bem que alterados por um leve estrabismo.

Vestia casimira clara, tinha um alfinete de esmeralda na camisa, um brilhante na mão esquerda e uma grossa cadeia de ouro sobre o ventre. Os pés, coagidos em apertados sapatinhos de verniz, desapareciam-lhe casquilhamente nas amplas bainhas da calça.

— Que deseja o senhor? perguntou Campos, metendo de novo a pena atrás da orelha e pousando um pedaço de papel mata-borrão sobre o trabalho.

O moço avançou dois passos, com ar muito acanhado, o chapéu de pelo seguro por ambas as mãos, a bengala debaixo do braço.

— Desejo entregar esta carta, disse, cada vez mais atrapalhado com o seu chapéu e a sua bengala, sem conseguir tirar da algibeira um grosso maço de papéis que levava.

Não havia onde pôr o maldito chapéu, e a bengala tinha-lhe já caído no chão, quando Campos foi em seu socorro.

— Cheguei

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