Amar verbo intransitivo
Sousa Costa largou por despedida:
— Está frio.
Ela muito correta e simples:
— Estes fins de inverno são perigosos em São Paulo.
Lembrando mais uma coisa reteve a mão de adeus que o outro lhe estendia — E, senhor... sua esposa? está avisada?
— Não! A senhorita compreende... ela é mãe. Esta nossa educação brasileira... Além do mais com três meninas em casa!...
— Peço-lhe que avise sua esposa, senhor. Não posso compreender tantos mistérios. Se é para bem do rapaz.
— Mas senhorita...
— Desculpe insistir. É preciso avisá-la. Não me agradaria ser tomada por aventureira, sou séria. E tenho 35 anos, senhor. Certamente não irei se sua esposa não souber o que vou fazer lá. Tenho a profissão que uma fraqueza me permitiu exercer, nada mais nada menos. É uma profissão.
Falava com a voz mais natural desse mundo, mesmo com certo orgulho que Sousa Costa percebeu sem compreender. Olhou pra ela admirado e, jurando não falar nada à mulher, prometeu.
Elza viu ele abrir a porta da pensão, Pâam.., Entrou de novo no quartinho ainda agitado pela presença do estranho. Lhe deu,um olhar de confiança.
Tudo foi sossegando pouco a pouco. Penca de livros sobre a escrivaninha, um piano. O retrato de Wagner. O retrato de Bismarck.
Terça-feira o táxi parou no portão da Vila Laura. Elza apeou ajeitando o casaco, toda de pardo, enquanto o motorista botava as duas malas, as caixas e embrulhos no chão.
Era esperada. Já carregavam as malas pra dentro. Uns olhos de 12 anos em que uma gaforinha americana enroscava a galharia negro-azul apareceu na porta. E no silêncio pomposo do casão o xilofone tiniu:
— A governanta está aí! Mamãe! a governanta está aí!
— Já sei, menina! Não grite assim!
Elza discutia o preço da corrida.
—... e com tantas malas, a senhora...
— É muito. Aqui estão cinco. Passe bem. Ah, a gorjeta...
Deitou quinhentos réis na mão do motorista. Atravessou as roseiras festivas do