O fio da memória

“O fio da Memória” – Dir. Eduardo Coutinho, 1988-91. O fio condutor desse documentário é a história de Gabriel dos Santos nascido em 1892 no interior do Rio de Janeiro. Filho de escravos, ele construiu a Casa da Flor, uma casa feita com entulhos e decorada com cacos de garrafas. Essa casa foi considerada por alguns como uma obra de arte similar às construções do arquiteto Gaudí, na Espanha. Além disso, a poesia da escrita de Gabriel poderia confundi-lo com um personagem de Guimarães Rosa. Ele passou boa parte de sua vida envolvido em duas obras: a casa e suas anotações. Em vários cadernos, durante longos anos, Gabriel fez anotações cotidianas sobre sua vida e sobre o que acontecia no Brasil (com as informações que chegavam a ele). Fragmentos destes diários são narrados ao longo do documentário. Em seus relatos há momentos que se relacionam com o conteúdo histórico, como dizer que o Brasil foi uma roça portuguesa, ou falar bem do Getúlio, ao lado de circunstâncias do cotidiano de cunho pessoal como “Guilherme me deu um pedaço de concha em 12 de março de 1964”. Essas leituras permitem compreender algumas das situações vividas pelos negros no processo que se inicia após o “13 de maio de 1888”. Portanto, a história individual de Gabriel dialoga com os fatos da história oficial, característica eminente na obra de Coutinho, sobretudo nesse filme. “O fio da memória” foi encomendado para a comemoração do centenário da abolição, em 1988, e tinha como objetivo resgatar a história dos negros no Brasil. A trama é construída por histórias de vida, visões de mundo, cotidiano, memória coletiva e pessoal, marginalidade social e cultural, arte, religião e política. São entrevistadas pessoas como: Manuel Deodoro Maciel, ex-escravo de 120 anos de idade, alunos negros discutindo abolição, a família que criou a escola de samba carioca Cacique de Ramos, menores abandonados e ex-baianas de acarajé. Missas afro, rodas de candomblé e de capoeira compõem as imagens do