Moradores de Rua Teorias
Durante três anos no Porto desenvolvi um trabalho com pessoas que vivenciaram a experiência de dormirem na rua, de não terem comida, de não terem nada assegurado nas suas vidas. Para eles cada dia era uma incerteza. Alguns ainda viveram em lugares com ratos, onde chovia e onde era impossível realizar as refeições.
As pessoas em situação de rua são como estranhos que não participam do cenário social. O papel da “não-pessoa” que exercem obriga a uma relação de desrespeito e discrepância frente aos indivíduos atuantes. Goffman alerta para os princípios de organização da sociedade, os quais se baseiam em indivíduos portadores de certas características sociais, o que lhes permite esperar que os outros o valorizem e o tratem de maneira adequada. Contudo, para as pessoas em situação de rua, estas características sociais que culminam em aceitação e integração social não conseguem acontecer e as “primeiras impressões” revelam-nas como gente com múltiplas carências. A negação destas pessoas como parte constitutiva da sociedade carrega “precauções para aprisionar um homem naquilo que ele é, como se vivêssemos com o perpétuo receio de que possa escapar do que é, possa fugir e de repente ver-se livre da própria condição”, ameaçando a convivência (Goffman, 2005: 75).
As informações que o morador de rua traz a seu respeito não constituem um repertório que se desdobra em confiança do mercado; não condiz com as oportunidades engendradas pela acelerada modernização; não o torna viável para o padrão que a vida social, a começar pela centralidade do trabalho. Este é o passo para a miséria e para a baixa autoestima, para distanciar indivíduos impactados negativamente