Memorial 9

1504 palavras 7 páginas
Num canto da abegoaria desenrolaram a enxerga e a esteira, aos pés delas encostaram o escano, fronteira a arca, como os limites de um novo território, raia traçada no chão e em panos levantada, suspensos estes de um arame, para que isto seja de facto uma casa e nela possamos encontrar-nos sós quando estivermos sozinhos. Em vindo o padre Bartolomeu Lourenço, poderá Blimunda, se não tem trabalhos de lavar ou cozinhar que ao tanque a levem ou ao forno a retenham, ou se não prefere assistir a Baltasar passando-lhe o martelo ou a turquês, a ponta do arame ou o feixe de vime, poderá Blimunda estar no seu resguardo de mulher de casa, que às vezes até a mais habituais aventureiras apetece, ainda quando não seja a aventura tanta como a que por derradeiro aqui se promete. Servem também os panos pendurados ao acto da confissão, posto o confessor deste lado de fora, postos os confitentes, um de cada vez, do lado de dentro, precisamente onde constantes pecados de luxúria ambos cometem, além de serem concubinos, se não é pior a palavra que a situação, aliás facilmente absolvida pelo padre Bartolomeu Lourenço que tem diante dos próprios olhos um maior pecado seu aquele de orgulho e ambição de fazer levantar um dia aos ares, aonde até hoje apenas subiram Cristo a Virgem e alguns escolhidos santos, estas espalhadas partes que trabalhosamente Baltasar vai conjugando, enquanto Blimunda diz do outro lado do pano, em voz alta bastante para que Sete-Sóis a ouça, Não tenho pecados a confessar.
Para o dever da missa não faltariam igrejas perto, a dos agostinhos descalços, por exemplo, que é a mais cerca, mas se o padre Bartolomeu Lourenço, como acontece, tem obrigações do seu ministério ou atenções e serviços na corte que o ocupem mais que o costumado de quem aqui nem precisaria vir todos os dias, se não acode o padre a espevitar o fogo da alma cristã que sem dúvida habita Blimunda e Baltasar, ele com os seus ferros, ela com o seu lume e a sua água, ambos com a ardência que os lança

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