Germânia - tácito
Tácito [1]
I
Toda a Germânia está separada das Gálias, da Récia e da Panônia pelo Reno e Danúbio; da Sarmátia e da Dácia por alguns montes e por seus mútuos temores. [2] O resto é circundado pelo Oceano, abrangendo golfos espaçosos [3] e vastas ilhas, com habitantes e reis que a guerra nos fez descobrir recentemente. O Reno nasce de um despenhadeiro inacessível dos Alpes Récios, e depois de torcer um pouco para o poente desemboca no oceano setentrional. O Danúbio, espalhado de um monte pouco elevado e de acesso suave no monte Abnoba, passa por muitos povos até que se lança ao Ponto Euxino por seis bocas [4], a sétima some nos pântanos.
II
Creio que os germanos são naturais da própria terra e que jamais se mesclaram com a vinda e hospedagem de outros povos; pois, antigamente, todos que emigravam não iam por terra senão por mar e são raros os navios que de nosso mundo se aventuram a penetrar no Oceano imenso e, por assim dizer, oposto ao nosso [5]. Ainda sem o perigo e o horror de um mar desconhecido, quem abandonaria a Ásia, África ou Itália para dirigir-se a essa Germânia áspera, de clima duro e de aspecto tão ingrato, não sendo para seus naturais?
Entoam velhos cantos (que são sua única história e todo os seus anais) ao deus Tuistão, nascido da terra, e a seu filho Mano, como raízes e fundadores de sua nação. A Mano dão-lhe três filhos, dos quais tomaram nome os ingevões, que são os mais costeiros, os herminões, que ocupam o centro, e os istevões, que são os restantes [6]. Alguns, porém, baseados em tal antigüidade, aumentam o número dos filhos do deus e aludem à denominação de mares, gambrívios, suevos e vândalos, afirmando que estes são seus verdadeiros e primitivos nomes e que o de Germania é novo e foi incorporado há pouco, pois os primeiros que passaram o Reno, desalojaram os galos, e agora se chamam tungros os que se chamavam germanos, de modo que um nome que era só de uma parte do povo foi prevalecendo até o ponto em que, desta