Fernando Pessoa, heterónimos

722 palavras 3 páginas
Lembro-me do Rogério. Agora os odores carnais, tão próprios da condição humana, rodeiam-me. O frio gela-me, penetra-me ao íntimo até nada de bom existir, nem a memória do quente permanece, essa já está muito distante, velha, decrépita, escondida debaixo do armário junto ao cotão. Sou sozinho nesta rua deserta em que nem a tosse interminável, dos outros como eu, me acompanha. Por isso derivo. Neste céu noturno surge o Sol de novo. Olho à minha volta, vejo com nitidez os espetros do dia que passou. Na rua cheia a civilização prolifera ignorante aos eternos cantos escuros onde homens desiludidos vagueiam aliciados por mulheres de rua. Cá fora, à luz do dia, uma figura destaca-se, autoritária, imponente, fitando-me com um esgar de desprezo pelo que represento. Duas imagens digladiam-se na minha mente. Passado e relativo Presente. Os pais do Rogério preparavam com amor e dedicação a sua chegada. O seu futuro brilhante era previsto e revisto na certeza do sucesso do pequeno médico. Todos os pais alimentam tais ilusões, nem todos os filhos as corroboram. Lembro-me do Rogério, uma criança alimentada e acarinhada por uma família numerosa. Desde cedo incentivado a cultivar certos interesses. Desde cedo cumpridor rebelde, que não se contentava, ambicionando a algo que o completasse. Procurava inconscientemente a enchente de sensações que um dia o arruinaria. Tudo começou com pequenos deslizes: escapadelas para aventuras irrealistas, avaliações que não faziam jus à sua pessoa, revoltas interiores e paternas cada vez mais frequentes. Em pequenos deslizes se espelhava um preocupante problema existencial: o anseio sensacionalista. Enfim chegou a idade de maiores decisões e a preocupação dos pais do Rogério culminou num conflito com o seu filho. O pequeno médico recusava, agora definitivamente, a sua carreira de sucesso. As artes traiçoeiras haviam tomado conta do seu consciente e abandonava tudo de mais puro em casa para rumar à febre futurista que

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