Faoro e o pensamento político irrealizado

Faoro e o pensamento político irrealizado

(Publicado no Caderno 2 do Estado de São Paulo em 26 de novembro de 2000) Livro que é um marco geral no pensamento do novo acadêmico discute herança lusa LUIZ GUILHERME PIVA Especial No livro Existe um Pensamento Político Brasileiro? (Ática, 1994) permanece como marco geral do pensamento de Raymundo Faoro - eleito na última quinta-feira para a Academia Brasileira Letras -, tal como em Os Donos do Poder, a idéia de estamento burocrático, monstro cujo locus é o Estado patrimonialista vindo a nós desde a unificação portuguesa. Tradição decisiva, transmitida pela colonização e pelo pombalismo, essa trajetória do estamento perfaz a "viagem redonda ou circular" que dá sentido à formação brasileira. Faoro crê não existir um pensamento político brasileiro, aquele que é forjado num "quadro cultural autônomo, moldado sobre uma realidade social capaz de gerá-lo ou de com ele se soldar". Também reconstrói a tradição das modernizações brasileiras, feitas, acredita, pela ação do Estado e do estamento, que impõem à Nação a "queima de etapas", descolando-a da sua "lei natural do desenvolvimento" - da "modernidade". A ligação entre os dois temas se dá pela transposição ao Brasil do Estado herdado de Portugal. Se pensamento político significa práxis, ação que busca resultados com base no "saber formulado a partir da experiência", no Brasil essa possibilidade se viu comprometida na nascente, uma vez que "o pensamento político brasileiro, na sua origem, é o pensamento político português". A linha do autor tem inspiração na visão hegeliano-marxista de desenvolvimento ideológico, econômico e social. Mas, na verdade, Faoro distancia-se dela no que toca à relação do sujeito histórico com a realidade. O que há em Faoro de hegelianismo é o trajeto histórico do desenvolvimento material e da consciência, ou, nos termos de Faoro, do pensamento político: a realização deste equivaleria à realização do liberalismo, com a plena otimização da capacidade