ellianadireito

380 palavras 2 páginas
Fome é o termo empregado de forma corriqueira quando se pretende expressar vontade, desejo de comer. Segundo o dicionário, outra forma de enxergar a palavra passa pelos significados de sofreguidão, falta, penúria, míngua, miséria. No entanto, nem eu, você, ou tampouco a estática descrição dicionarista compreendemos o verdadeiro sentido; somos estrangeiros frente a essa árida sensação. Pelo menos é por meio deste impactante argumento que Garapa, último filme de José Padilha, diretor de Ônibus 174 (2002) e do aclamado Tropa de Elite (2007), pretende relacionar-se com a consciência dos espectadores. Em um projeto articuladamente etnológico, centrado especialmente na realidade social, o nível de agressão que se instaura durante as quase duas horas de exibição certamente não encontra precedentes em nenhum dos demais gêneros cinematográficos.

A postura imposta por Garapa se instala na mais pura observação documentarista - ainda que "pureza" seja um termo bastante discutível em se tratando de documentários - e faz questão de desviar de qualquer complexidade narrativa ou invenção ficcional. Prescinde, para tal, de qualquer argumento de deslocamento ou artifício de quebra, não lembrando em nada, por exemplo, as controversas experimentações de Eduardo Coutinho em Jogo de Cena (2007) ou Moscou (2009). Padilha se nutre principalmente da própria ausência ao não construir o resultado e sim deixá-lo construir-se por si mesmo, de forma mínima e gradual. Narrativamente, a proposta se forma e conta, basicamente, a partir do registro de três famílias do Ceará, duas localizadas no sertão cearense e a outra, na periferia da capital Fortaleza. Se a geografia as distingue, a penúria dos cotidianos não faz mais que apagá-las ou transformá-las em estatística. Também para não permitir que os dados camuflem a realidade é que o filme traz à tona não somente a total ausência da dignidade humana e suas descrições há tempo conhecidas, mas se propõe a enxergar de fato como é conviver

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