MÁRCIO LOUZADA CARPENA
DA (DES)LEALDADE NO PROCESSO CIVIL
MÁRCIO LOUZADA CARPENA
Mestre em Direito
Professor da Faculdade de Direito da PUC/RS
Advogado
Artigo doutrinário inserido na Juris Plenum nº 85, novembro de 2005.
SUMÁRIO: 1. Introdução - 2. Do dever de lealdade processual - 3. A quem se dirige o dever de lealdade - 4.Conseqüências decorrentes da quebra ao dever de lealdade: 4.1. Da multa por prática de ato atentatório ao exercício da jurisdição; 4.2. Da multa, indenização, pagamento de custas e honorários advocatícios por ato eivado de má-fé; 4.3. Multa por atentado ao processo de execução - 5. Conclusão - 6. Bibliografia.
1. INTRODUÇÃO
No Brasil, nos últimos tempos, fixou-se pontual e inegávelfortificação à idéia de efetividade da prestação jurisdicional a partir de conduta processual socialmente exigível ou aceitável dos cidadãos nas lides.
De fato, por meio do prosseguimento à reforma do Código Processual Civil pátrio, mais especificamente pela Lei 10.358, de 27 de dezembro de 2001, definiu-se de forma absoluta o dever de colaboração de todos, partes ou não, com a operacionalidade eefetividade do processo; tonificou-se a exigência de posturas essencialmente éticas por parte dos litigantes e terceiros, instando-os a cooperar com a celeridade do procedimento judicial o que, em última análise, reflete na atuação e eficiência do órgão jurisdicional na aplicação do direito.(1)
Hoje, há a disposição do dever de lealdade e probidade no processo como um dos pilares de sustentaçãodo sistema jurídico-processual, motivo pelo qual se afigura de importância continental não só a sua correta compreensão, como também a dos instrumentos processuais existentes que garantem a sua fixação.(2)
2. DO DEVER DE LEALDADE PROCESSUAL
A lealdade compreende postura ética, honesta, franca, de boa-fé, proba que se exige em um estado de direito; ser leal é ser digno, proceder deforma correta, lisa, sem se valer de artimanhas, embustes ou artifícios.
Em sede de direito processual, a lealdade, na concepção teleológica, significa a fidelidade à boa-fé e ao respeito à justiça, que, entre outras formas, traduz-se não só pela veracidade do que se diz no processo, mas também pela forma geral como nele se atua, incluindo-se aí, o que não se omite.(3)
Trata-se, em realidade, alealdade de um dever a ser observado pelo jurisdicionado. Está intimamente ligada ao princípio da probidade processual, segundo o qual cabe às partes sustentarem suas razões dentro da ética e da moral, na observação de Nery e Nery, não se utilizando da chicana e fraude processual. Divide-se a probidade em: a) dever de agir de acordo com a verdade; b) dever de agir com lealdade e boa-fé; c) deverde praticar somente atos necessários à sua defesa.(4)
Parte da doutrina italiana, entre ela Virgílio Andrioli, difere lealdade de probidade, salientando que a primeira corresponde ao fato de se ser sincero, não compactuando com a má-fé e a traição, ao passo que a segunda diria respeito à atuação com retidão.(5) A doutrina brasileira, no entanto, não tem feito tal distinção, tratando a lealdadee a probidade como sinônimos.
Seja como for, tem-se, hoje, que tanto as partes como terceiros que participam da lide têm o dever de firmar postura socialmente adequada, colaborando(6) com o Poder Judiciário na busca da efetivação da Justiça. Tal concepção fundamenta-se na idéia fecunda de bem comum, a partir da eficácia do sistema jurídico-social empregado hodiernamente, sendo pressupostoexigível básico de uma sociedade que deseja ser justa e solidária.
Com efeito, a partir do momento em que se definiu que o processo civil se situa no ramo do direito público,(7) tendo perspectiva coletiva fundada no bem comum da sociedade, afastando-se das idéias de liberalismo e individualismo,(8) sucumbiu a perspectiva defendida por doutrina mais antiga, cuja orientação era no sentido de não...